Despesas discricionárias são aquelas sobre as quais o governo tem algum poder de decisão, diferentemente das obrigatórias. No PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2021, essas despesas somam R$ 83,9 bilhões, ou apenas 5,4% do Orçamento total de R$ 1,55 trilhão.
‘Cláusula de calamidade’
Na semana passada, ao falar sobre a possibilidade de retomada do auxílio em formato mais enxuto e para metade dos beneficiários – já que a outra metade recebe Bolsa Família -, o ministro Paulo Guedes disse que isso só seria possível “dentro de um novo marco fiscal” e “se dispararmos as cláusulas necessárias”.
Conforme o portal G1, o secretário de Tesouro Nacional, Bruno Funchal, explicou na sexta-feira (5/2) que a cláusula a que Guedes se referia deve ser incluída na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do Pacto Federativo.
Ela permitira a suspensão temporária da chamada “regra de ouro”, que proíbe o governo de tomar dívida para pagar despesas correntes. Em contrapartida, seriam acionados gatilhos a fim de conter o aumento dos gastos obrigatórios.
“A possiblidade de furar o teto é quando há uma despesa absolutamente imprevisível. Mas o Tribunal de Contas pode falar: ‘Como assim, imprevisível? Era previsível, isso deveria ter sido colocado dentro do Orçamento, já com a previsão de recursos e cumprindo o teto. Não é surpresa'”, diz a consultora econômica Zeina Latif. “Essa ideia do governo, portanto, é para evitar problemas com o Tribunal de Contas.”
“Já era bola cantada que teríamos problemas. Não dava para cravar que teríamos uma segunda onda da pandemia, alguns especialistas falavam e o assunto era controverso. Mas o risco nos sabíamos que existia”, afirma Latif.
“O que é lamentável é o governo não ter se preparado para isso, diante da incerteza. Eles passaram meses dizendo que uma extensão do auxílio não seria necessária e não se prepararam. Me incomoda o improviso.”
No domingo (7/2), a Folha de S. Paulo reportou, com base em informações de bastidores, que o Ministério da Economia estaria trabalhando numa proposta de retomada do auxílio com o pagamento de três parcelas no valor de R$ 200, com foco em trabalhadores informais não beneficiários do Bolsa Família.
Conforme o jornal, a assistência teria o nome de BIP (Bônus de Inclusão Produtiva) e, para receber o auxílio, o beneficiário teria que participar de um curso para qualificação profissional.
“Parece não fazer muito sentido”, avalia Couri, da IFI, sobre a exigência de curso de formação.
“O auxílio se justifica justamente por uma dificuldade que ainda existe no mercado de trabalho. Então as pessoas vão se capacitar para um mercado que não está aquecido”, afirma.
“Além disso, está sendo imposto um custo à pessoa, de ou ter internet para fazer um curso virtual ou se locomover até o local do curso. Não parece estar de acordo com a natureza de um auxílio emergencial e temporário. Afinal, são três parcelas. Quem vai se capacitar em três meses?”, questiona o economista.
A consultora Zeina Latif, por sua vez, avalia que faz sentido requalificar trabalhadores, diante de um mercado de trabalho que será diferente no pós-pandemia, exigindo novas habilidades dos profissionais. Mas, segundo ela, “o diabo mora nos detalhes”.
“O que foi estudado para se implementar isso? E o que exatamente quer se implementar? Uma coisa é você fazer um grande enunciado, outra coisa é por no papel uma política pública que faça sentido, que seja factível e à qual as pessoas vão ter acesso de fato”, afirma.