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Venezuela afirma ter detido invasão de ‘mercenários’ vindos da Colômbia

CARACAS — Em pronunciamento que despertou suspeitas entre membros da oposição, analistas e jornalistas locais, o governo da Venezuela informou ter frustrado uma incursão de “mercenários terroristas” que tentavam entrar no país por via marítima, pilotando lanchas vindas da vizinha Colômbia, neste domingo.

Segundo informou o ministro do Interior, Néstor Reverol, as forças de segurança feriram vários membros do grupo e “abateram” outros que desembarcaram em terra no início do dia, perto de La Guaíra, cidade na costa a cerca de 32 quilômetros da capital, Caracas. A lancha foi detectada a cerca de cinco quilômetros do aeroporto internacional de Maiquetía e à mesma distância de uma base naval da Força Armada Nacional Bolivariana (FANB), fato que aumentou a desconfiança de opositores.

Muitos acreditam que o violento episódio não teve nada a ver com uma invasão militar e terrorista estrangeira e que será usado pelo governo do presidente Nicolás Maduro para intensificar a perseguição a opositores dentro do país.

Em redes sociais, jornalistas venezuelanos como Federico Black mostraram alguns dos elementos encontrados na lancha: protetor solar, um pacote de tortilhas, um carregador de celular e um capacete seco com uma pequena bandeira dos Estados Unidos, entre outras coisas. Na Venezuela, onde a informação virou meme,  especula-se com uma possível operação de contrabando ou narcotráfico. Mas o governo garante que tratou-se de uma tentativa de ataque externo.

— Eles tentaram realizar uma invasão pelo mar, um grupo de terroristas mercenários procedentes da Colômbia, para cometer atentados terroristas no país, assassinando os líderes do governo revolucionário — disse Reverol.

Segundo o presidente da Assembleia Constituinte, Diosdado Cabello, oito pessoas foram mortas e duas detidas na operação em que as forças do governo frearam a incursão.

— Conseguimos desativar uma incursão em nosso território, graças ao trabalho da Inteligência —  disse Cabello, segundo homem mais poderoso do regime, que comanda o organismo criado pelo presidente Nicolás Maduro em 2017 para esvaziar os poderes da Assembleia Nacional, onde a oposição tem maioria.

Entre analistas, a versão não convenceu. Para Carlos Romero, professor da Universidade Central da Venezuela (UCV), “o que o governo diz tem baixa credibilidade. Ninguém que conhece nosso país pode acreditar que tentariam nos invadir entrando por La Guaira”.

— Isso será usado para acusar outros. Aqui na Venezuela virou piada — assegurou Romero.

Na rede social Twitter, o ex-policial Iván Simonovis, que esteve 14 anos preso e desde 2018 está exilado nos EUA, assegurou que “o regime está fabricando outro teatro em Vargas (estado onde está localizada La Guaíra) para aprofundar a perseguição e repressão contra o governo interino (de Juan Guaidó) e qualquer venezuelano que se oponha à ditadura”.

Maduro frequentemente acusa adversários políticos de tentar depor seu governo com o apoio dos EUA, que lideram uma ofensiva para expulsá-lo do poder com sanções que prejudicaram as exportações do petróleo venezuelano. Críticos do governo normalmente descartam as acusações, considerando-as desculpas para deter opositores.

Em agosto de 2018, no entanto, Maduro foi alvo de um atentado com drones durante uma parada militar em Caracas, que teria sido comandado por militares desertores. No final de abril de 2019, os dirigentes opositores Guaidó e Leopoldo López chegaram a anunciar um motim militar para depor o governo, mas a intentona acabou fracassando.

A tensão política na Venezuela atingiu seu auge no início de 2019, quando Maduro tomou posse para seu segundo mandato. A reeleição do dirigente não foi reconhecida pela maioria dos países vizinhos, que reconheceram Guaidó, presidente da Assembleia Nacional, como “presidente interino”. Apesar disso,  Maduro continuou comandando de fato a Venezuela, com apoio da cúpula das Forças Armadas e de aliados como China e Rússia.

No início de abril deste ano, o Comando Sul das Forças Armadas dos Estados Unidos anunciou que estava dobrando sua presença no Caribe, a fim de pressionar Maduro. No Brasil, o governo Bolsonaro, que assim como os EUA reconhece Guaidó como presidente interino do país vizinho, também aumentou a tensão com Caracas, ordenando a saída do país dos diplomatas indicados por Maduro.

De acordo com previsões da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), este ano a economia venezuelana sofrerá queda de 18%, a maior do continente. As sanções aplicadas pelos Estados Unidos aprofundaram uma crise que já era grave e nos últimos meses ficou ainda mais complicada pela falta de gasolina. Segundo a oposição, o problema afeta 86,6% dos venezuelanos. Já o fornecimento irregular de água, elemento essencial em matéria de prevenção do coronavírus, é uma dor de cabeça diária para 75,8% dos venezuelanos.

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